terça-feira, 1 de abril de 2014

A devoção


Algumas pessoas sentem falta de devoção. A devoção e seus aspectos místicos sempre foram importantes na história da humanidade. A porta da devoção, já nos tempos de Buda, era destacada como uma das práticas de yoga, a “Bhakti Yoga”. Ocorre que o budismo fez uma “terra arrasada” das crenças e isto fez com que muitas pessoas se sentissem desamparadas, o que ocorre ainda em nossos dias. Algumas pessoas sentem-se chocadas quando chegam ao Zen e percebem que não existe nada onde se agarrar ou alguém a quem apelar.

À medida que o budismo se expandia, tinha que lidar com a cultura que estava disponível. Na Índia, os sutras iniciais falam dos “deuses do hinduísmo”. Os autores escreveram que os deuses solicitaram a Buda que ele ensinasse o Dharma, até mesmo aos próprios deuses. Quando o budismo chega à China encontra aspectos tonfucionistas e taoístas.  O budismo, então, incorpora muitos símbolos e palavras confucionistas e taoístas, pois essa era a maneira de expressar os pensamentos.

Do confucionismo o budismo adota o conceito de “devoção filial” e reverência aos antepassados. Os primeiros chineses, não se identificando com o vazio do pensamento budista sentem-se chocados e, em razão disso, são escritos Sutras Mahayanas que enfatizam a devoção filial. Era uma forma do budismo dizer que não combatia a cultura chinesa de devoção, mas sim a incorporava.

Os deuses da China e do Tibete também foram incorporados ao panteão budista popular. Ocorreu o mesmo quando o budismo chegou ao Japão e encontrou os diversos deuses do Xintoísmo. Como forma de incorporar esses deuses, o budismo os transforma em protetores. Ainda hoje encontramos nas casas japonesas deuses xintoístas como divindades budistas protetores do lar. Aqui mesmo em nossa sangha há logo na entrada uma estátua de “Jizo Bosatsu”, representado com um bastão em uma das mãos e na outra uma criança. Jizo Bosatsu é o protetor das crianças e dos viajantes. É originário dos tempos de Buda? Não, é uma divindade local  incorporada ao Zen e transformada em Bodhisattva.

Nem Buda pode ser considerado um ser de devoção, pois foi um homem como nós que mostrou que era possível se iluminar. Como havia nas pessoas a necessidade de devoção, foram criados seres como o “Bodhisattva da Grande Prática”, Fugen, o “Bodhisattva da Grande Sabedoria”, Manjusri ou ainda Kannon, o “Bodhisattva da Compaixão”. Esses Bodhisattvas são, então, expressões das necessidades devocionais. Se você perguntar para um grande mestre Zen se todos os Bodhisattvas existem de fato, a resposta dele será, “Se você acredita neles, eles existem”.