segunda-feira, 20 de agosto de 2018

A Contestação no Zen


Já expliquei algumas vezes as virtudes do discípulo, pois em geral todas as pessoas que estão praticando são alunos. O aluno senta, ouve, discorda, tem suas próprias ideias. Com o tempo as ideias podem mudar, mas ele tem ideias naquele momento e isso é perfeitamente admissível. No tempo de Buda, as pessoas faziam perguntas capciosas ou mesmo tentavam debater com ele, e isso é legítimo no Zen, é bem estruturado e até ritualizado. Existe uma cerimônia em que você interroga o Mestre com a pergunta mais louca que você imaginar e o Mestre responde. Chama-se Mondô.

Eu já fiz essa cerimônia algumas vezes, você vem com a pergunta que você preparou, faz a pergunta se ajoelha na frente do Mestre que está em pé com kyosaku na mão, ele responde e bate em seu ombro. Então você recua de costas agradecendo. O que as pessoas tentam é colocar o Mestre num beco sem saída, e o Mestre precisa ter confiança para fazer esse tipo de cerimônia. Ela de certa maneira repete o que acontece na cerimônia de graduação do monge noviço, quando ele passa a Zagen, depois de um treinamento. O Mestre pode pedir para o Monge fazer essa cerimônia. O Monge fica sentado e diz a todos: “desafiem-me”. Então as pessoas fazem perguntas sobre o Dharma e ele tem que responder sem hesitar, sem escapar de alguma maneira fácil, e pode ser contestado, podem dizer que não gostaram da sua resposta, pedir para que explique-se melhor, etc. É um combate do Dharma e ele tradicionalmente é feito da forma em que as pessoas subam de tom até os gritos, e o Monge tem que se impor. Após essa cerimônia, ele deixa de ser um noviço e continua praticando até o próximo passo que seria, se o Mestre reconhecer nele uma realização espiritual, a transmissão.


[Trecho de palestra proferida por Meihô Genshô Sensei]