sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Cortar a raiz do sofrimento



Saikawa Roshi continua:  "Está escrito no Sutra do Coração que por ver a vacuidade você liberta a si mesmo, mas isso é apenas a metade. Para usarmos uma metáfora, a vacuidade é como um espelho e um espelho está sempre vazio, mas ao mesmo tempo, todo o mundo está dentro dele. Para o caminho Budista ter nada é ter tudo, essa é a verdade sobre nós mesmos. Se vocês realmente entenderem isso indo profundamente dentro de vocês mesmos, poderão ir além, uma vez que ganho e perda, vida e morte não representarão nada, pois vocês serão um com o universo. Não haverá divisão entre eu e os outros, entre sujeito e objeto. Se vocês realmente virem isso, poderão apreciar suas vidas. Digo até que poderão apreciar seus sofrimentos, pois a raiz do sofrimento pode ser cortada e cortar a raiz é importante, pois só assim poderão aceitar todas as coisas, inclusive a morte. Morte e vida, ganho e perda, eu e os outros são apenas uma idéia dentro da mente e o verdadeiro “eu”, está além desses conceitos em nossas mentes.

Muitas pessoas me perguntam se Budismo é compaixão. Posso dizer que isso seja verdade, mas só se vocês virem que não há divisão entre vocês e os outros, só assim poderão cuidar dos outros como cuidariam de vocês mesmos. Sem essa verdadeira experiência, a compaixão será apenas um entendimento intelectual, mas o Zen não é uma compreensão mental e sim é ter uma verdadeira experiência. Para alcançar esse entendimento usamos o zazen e através dele poderemos ter a verdadeira apreciação da vida. Quer vocês entendam ou não, poderão sentir a base da unidade."

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

A dualidade é uma boa ferramenta



Saikawa Roshi
: - "Quando sentados em “shikantaza”, que é a técnica do zazen, qualquer coisa que surja em suas mentes vocês devem deixá-las ir da mesma forma que vieram, sem tocá-las, compará-las ou julgá-las como boas ou ruins, certas ou erradas. Não toquem em nada. Com essa técnica estamos criando em nossa mente a não dualidade.

Na vida diária temos 100% de dualismo, bom ou ruim, eu e os outros, ganho ou perda, grande ou pequeno, vida ou morte e iluminação e delusão. Em todo o tempo, nessa dualidade, estamos checando e continuando com nossos pensamentos, mas a dualidade é um excelente instrumento para resolver problemas e nos comunicarmos com outras pessoas, assim, nossa mente cria a dualidade.

Toda a ciência e filosofia estão baseadas no dualismo, por isso a dualidade é uma grande ferramenta, mas também é capaz de criar grande sofrimento para a humanidade. Se vocês vão realmente fundo dentro de vocês, conseguirão ver que nós mesmos e todo o mundo não somos duais. Se vocês realmente virem esta verdade, poderão perceber que também a verdade é não dual. A base do mundo é não dual. Vendo essa verdade vocês poderão salvar a si mesmos e ir além de bem ou mal, poderão ir além de ganho ou perda, poderão ir além de vida ou morte, poderão ir além de iluminação e delusão.

Temos a tendência de usar nossa mente e dessa forma é muito difícil de entender um ser não dual. Na vida diária esse som (bate no chão) é um objeto e eu sou sujeito. Mas esse som (bate no chão) está além de sujeito e objeto. Na vida diária nós usamos eu, meu e minha ou seu e sua, por exemplo, dizemos esse é meu corpo, minha pele, meu sangue, meu rim e meus olhos, mas se vocês forem fundo dentro de vocês mesmos, verão que isso é apenas uma expressão. Se eu dôo meu rim pra Genshô, ele passa a ser o rim de Genshô. Se Genshô der esse rim para Tokushi, esse rim passará a ser de Tokushi, então, na verdade, esse rim não é meu. Se for assim com todas as partes do meu corpo, então esse “meu” não existe. Nós pensamos “minha mente”, “minha opinião”, mas mesmo essa opinião veio dos outros e não desse corpo. Minha mente e minha opinião também não existem. Tudo bem você dizer “meu sangue” na sua vida diária, mas sob o ponto de vista absoluto, “meu sangue” não existe. Isso que chamamos meu corpo e minha mente, é vazio."

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

O iluminado não está iludido com causa e efeito


Pergunta: - Eu achei isso tudo muito complicado. Na compreensão do objeto há um momento em que o senhor diz que todos os fenômenos são iguais.

Venerável Dhammadipa – Nem todos os fenômenos são iguais. Há um extremo em “todos os fenômenos são iguais” e outro extremo em “todos os fenômenos são diferentes”. Buda, embaixo da arvore Bodhi, realizou a originação dependente, se você compreender o que ele realizou, você entenderá que “ser” é um extremo e “não ser” é outro extremo. Buda explicou a originação dependente indo além desses extremos. “Tudo é igual” é um extremo, “tudo é diferente” é outro extremo. A fim de transcender os dois extremos, que é a causa de tantos conflitos, você deve estudar a originação dependente e isso não é fácil de compreender.

Há uma história muito famosa na tradição Zen que com certeza Genshô Sensei já lhes contou. É a história de Pai-Chang, em Japonês - Hyakujo, um grande mestre responsável pela “chineificação” do Budismo, responsável por novas e importantes regras de condutas dos monges na China. A regra de conduta era como se fosse uma bíblia ensinada por Buda. Existe uma montanha na China com seu nome dado sua importância e nessa montanha ele ergueu seu monastério. Foi dele a regra de um dia sem trabalho, um dia sem comida e também a idéia de que todo dia é um bom dia. Ele influenciou muito a Escola Soto, que é a que vocês praticam. Em todas as noites que o Mestre Pai-Chang realizava suas palestras, aparecia um senhor muito idoso e prestava muita atenção às suas palavras. Ninguém sabia nada de sua vida, pois logo após o término das palestras, ele se retirava. Um dia ele perguntou ao Mestre Pai-Chang: “O iluminado está acima de causa e efeito”? “O iluminado não está iludido com causa e efeito” - foi a resposta do Mestre Pai-Chang. Então o homem começou a chorar e disse que há muitas vidas atrás uma pessoa lhe fez essa mesma pergunta e ele respondeu que o iluminado estava acima de causa e efeito. Em razão dessa resposta, desde então ele renasceu muitas e muitas vezes como uma raposa. “Agora eu compreendo e sou muito grato por sua resposta” disse o idoso. Após essa passagem, o homem desapareceu. No outro dia, Mestre Pai-Chang pediu que seus discípulos fossem até a montanha e procurassem pelo corpo de uma raposa branca. Depois de encontrado o corpo, Mestre Pai-Chang ordenou que fosse cremado. Até hoje na montanha Pai-Chang existe a rocha da raposa branca.

Por favor, tenham muito cuidado ao responder uma pergunta de forma definitiva. A originação dependente tem o objetivo de resolver todos esses conflitos e quando você a compreende, os conflitos cessam e seus problemas estarão resolvidos.

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Budismo, Ioga e cristianismo


P: Haveria no Yogacara alguma coisa semelhante aos oito passos, assim chamados no Ioga de Ashtanga?

Venerável Dhammadipa – Não exatamente, mas a Escola Yogacara tem muitos aspectos similares aos Sutras de Patanjali. Você poderá observar diversas influências mútuas entre eles sendo que possuem um dialogo entre si muito maior do que normalmente é visto e aceito. Não há muitos bons estudos sobre esse assunto, o que é uma pena, pois essa área deveria ser melhor explorada. Essas tradições do Yoga na Índia têm mais inter-relação do que se imagina. Esse sectarismo não foi muito
encorajado na Índia. Se você visitar um lugar chamado Ellora, na Índia, irá observar lugares de iogues hindus Budistas e Jainistas vivendo lado a lado. Há relatos de viajantes chineses que visitaram a Índia e de praticantes Mahayana e Hinayana que viviam juntos nos mesmos monastérios lado a lado com os iogues hindus sem problema algum. Essa visão sectária surgiu muito tempo depois, principalmente após a invasão do Islã. Diferentes tipos de religião tentam se proteger, por isso essa abertura se perdeu.

Seria muito importante para o ocidente não estudar o Budismo de forma a evidenciar uma separação, mas sim uma união. Há uma tendência de cada escola criticar a outra e isso deveria ser evitado favorecendo o diálogo entre cada praticante das diferentes escolas. É muito importante também o diálogo com o Cristianismo que tem grande poder no ocidente. Diversas idéias são muito similares e o Cristianismo poderá se beneficiar muito com o estudo do Budismo. A China se tornou a segunda terra mãe do Budismo e daí se espalhou para Japão, Coréia etc. Um acontecimento que colaborou para tornar o Budismo forte foi seu dialogo com Confucionismo e Taoísmo e o Zen é um produto desse diálogo, que dessa forma, tornou-se acessível aos Taoístas e Confucionistas. O Taoísmo tornou-se muito rico pela influência Budista e, da mesma forma, o Budismo na forma do Zen, cresceu muito sob a influência dessas duas escolas. Esse espírito infelizmente está se perdendo no ocidente.

Como todos sabem, no ocidente as religiões eram muito opressivas, idéias de escolas diferentes não somente não eram aceitas, como eram combatidas até mesmo com violência. O Budismo pode trazer uma atmosfera mais aberta ao diálogo e dessa forma, tornar-se mais influente não só no Brasil, mas em toda a América e Europa. Mas infelizmente quase nada é feito nesse sentido. Claro que há algumas conquistas, mas estamos muito no começo, quem sabe as gerações futuras como disse Genshô Sensei possam ser beneficiadas, mas hoje não sentimos os benefícios desse diálogo entre Budismo e outras correntes, justamente por serem muito raros. Por isso o Budismo ainda é muito pouco conhecido e vocês devem tentar fazer algo nesse sentido no Brasil.

Fiquei impressionado como as pessoas são livres e abertas no Brasil, até mesmo a religião Católica é mais aberta que em outros países. Eu já dirigi e participei de retiros em monastérios católicos aqui no Brasil, realmente as pessoas são muito abertas.

Os quatro ilimitados



Ven. Dhammadipa continua:  - Os quatro ilimitados são assim chamados porque os objetos em si são ilimitados e no Budismo os objetos ilimitados são os seres sencientes. Os Sutras do Conhecimento transcendental são a base do conhecimento Mahayana e outro grande sutra é o “Makahannya Shingyo”, o sutra que vocês recitam. Essa literatura transcendental é até mais vasta que os próprios Ágamas, mas pode ser resumida em uma frase: “Tudo é vazio”. Nos Sutras da Sabedoria Transcendental todos os seres senscientes são estendidos ao universo. Os Arahats não vêem nenhum ser senciente, apenas vêem os skandhas, ou os agregados. Eles precisam prestar muita atenção em uma pessoa para percebê-la, caso contrario só percebem os agregados.

 Na Sabedoria Transcendental todos os objetos tornam-se amor, compaixão, alegria e equanimidade. Por exemplo, é muito comum no ocidente quando uma pessoa bate com a cabeça numa porta, que fique bravo, fale mal e chute a porta. Devemos praticar amor e compaixão pela porta. Os quatro ilimitados estão relacionados aos ilimitados do sem desejos.

 Essa é a situação que o Buda se encontra. Buda não necessitava ver um objeto em particular. Ele estava sempre conectado com alegria, amor, equanimidade e compaixão. Essa é uma idéia superior. Essa é a conquista última das perfeições. Mesmo que seja muito difícil, é muito benéfico o atingimento e compreensão dessa idéia, ainda que eu mesmo não seja capaz de fazê-lo tento o meu melhor e os encorajo a tentar também.

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

O que nos prende ao samsara


P: Apenas uma curiosidade. Como é a sua vida de praticante, qual seu mestre atual e qual seu método de praticar?

Venerável Dhammadipa – Estudei diferentes métodos de meditação. Em primeiro lugar estudei os métodos tradicionais, Samatha e Vipassana, me tornando sólido nesses métodos para depois ensiná-los. Atualmente eu ensino os quatro Paramithas, compaixão, alegria, amor e equanimidade. De acordo com o Budismo, o Samsara é baseado em sentimentos, assumir os sentimentos assim como o próprio “eu”, são a ligação entre o interior e o exterior. O que Buda realizou sob a árvore Bodhi foi a “Originação Dependente”, e todas as tradições estão de acordo com isso. Mas há diversas explicações nas diferentes tradições sobre o que seja a originação dependente e, como resultado dessas diferentes explicações surgiram diferentes escolas Budistas.

A base para nossa compreensão da originação dependente são os doze elos. O primeiro elo é a ignorância, da ignorância surgem as formações mentais, dessas surgem a consciência, da consciência surge Nama-rupa ou as formas, das formas surgem os seis sentidos, que são as cinco faculdades sensoriais e a faculdade mental, o sexto elo é o contato, do contato vem os sentimentos, sétimo elo, que são sensações e percepções. Na China e no Japão esse elo pode ser entendido como a recepção do objeto, temos que tocá-los para percebê-los, quando recebemos essa informação é que as classificamos em agradável, desagradável ou neutro. Das percepções surge o apego e do apego surgem nascimento, morte e existência. Existência significa carma e as formações mentais também são carma. Dessa diferenciação surge a ignorância e então o ciclo recomeça.

Estamos retornando ao Samsara devido a uma não compreensão desse processo de recepção dos objetos. A ignorância e as formações mentais nos trazem à vida e continuamos na vida nos apegando aos sentimentos. A vida aqui significa a vida baseada no sofrimento. Assumindo que o impermanente é permanente, assumindo que a pena é prazerosa, essa é a base das formações mentais, o carma. As formações são a base para diferenciar Samsara. A consciência do Samsara é caracterizada por esse apego aos sentimentos e percepções, apego ao processo de recepção dos objetos, meu olho, minha cor, minha mente, minha ideia. Essa é nossa algema ao Samsara. Todas as tradições Budistas concordam que a forma de quebrar essa algema está nesse processo de percepção dos objetos. Entender o processo de recepção e percepção dos objetos é muito importante. Minha prática principal é a contemplação disso e entender a diferenciação e a ilusão da mente discriminativa.  O que basicamente ensino, mas não necessariamente pratico, é o ensinamento do Samatha e Vipassana, é como a prática dos quatro ilimitados. É muito importante abrir seu coração.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Tudo é incomensurável



Venerável Dhammadipa continua: A abordagem do Abhidharma no contexto Mahayana é diferente. De acordo com o ensinamento Mahayana, há apenas uma realidade última, não podendo haver realidades alternativas, sendo que a realidade última é o vazio. Todos os fenômenos, sejam eles mundanos ou supramundanos, têm a mesma característica do vazio. De acordo com o Mahayana, o foco não está em uma dedução analítica do fenômeno experienciado e sim em uma experiência direta do vazio, isso não significa que a abordagem analítica não seja importante. É muito importante e é um complemento da experiência direta do vazio.

Eventualmente o Vipassana do Budismo do norte, que se identifica com o Mahayana, foi associado ao conhecimento direto da realidade. As coisas como elas realmente são e o vazio, são ao mesmo tempo impermanentes e além da impermanência. Há uma realidade última a ser experienciada, que é considerado o Vipassana mais elevado e está além do mundano e supramundano, é a verdade atravessando a dualidade. Entender essa realidade é a natureza do Vipassana e é a base do Samatha. No contexto do Zen, Samatha pode ser entendido como a observação direta do que é impermanente, uma vez que está relacionado, portanto, com tudo que está mudando e não é diferente dessa realidade impermanente.

O Bodhisatva é aquele que, com base na observação, desenvolve compaixão e com base na visão além da impermanência e do vazio, desenvolve sabedoria. A compaixão e a sabedoria são como as duas asas de um pássaro. Contemplando a impermanência, uma pessoa é capaz de compreender e penetrar na natureza da compaixão e desenvolver a mente de Bodhichita. Bodhichita é a forma de entender que não há nenhuma liberação individual, a natureza da realidade é não dualística. A busca da observação direta daquilo que realmente é e do vazio, são os meios hábeis do Bodhisatva para permanecer no ciclo do Samsara com o mínimo de sofrimento. Desenvolvendo o Vipassana, o Bodhisatva se compromete a permanecer no Samsara e através do Samatha ele desenvolve a sabedoria para continuar no Samsara sem sofrimento. É dessa forma que os dois se complementam para formar uma única realidade no Zen.

Quanto você pratica o Zen, combina Samatha e Vipassana. O objetivo do Zen é observar as coisas como elas são. Quando você compreender e realizar essa realidade, estará no caminho do Bodhisatva e não poderá voltar atrás. Os quatro tipos de Samadhi que mencionei anteriormente são os “Samadhi de Buda”. Esse é o objetivo do Zen. A mente se torna uma com o Dharmakaya, a manifestação de todos os fenômenos. O corpo do Dharma. No limite da realidade, todas essas denominações são similares e o Buda está sempre vivendo nessa realidade, ele se tornou um com a realidade verdadeira. Na tradição Theravada, Buda e o Dharma são sinônimos. No Mahayana é enfatizado que o verdadeiro Buda é o Dharmakaya e ele contém tudo sem distinção entre forma e não forma. No Sutra do Coração existe uma parte que diz “forma é vazio e vazio é forma”, isso conduz a compreensão da realidade última. Essa realidade é enfatizada no Zen diferentemente de outras tradições como no próprio Yogacara. Nessa realidade última, tudo é incomensurável. Forma é incomensurável. Sentimento é incomensurável. Percepções são incomensuráveis. Formações mentais são incomensuráveis. A própria consciência se torna incomensurável. Esse é o conteúdo da libertação.
 

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Vipassana e Zazen



PERGUNTAS AO VENERÁVEL DHAMMADIPA


Pergunta:  - O senhor falou que o Vipassana está muito conectado com o Zen, então minha pergunta é: como os ensinamentos do Vipassana podem nos ajudar especificamente no zazen?

Venerável Dhammadipa – Há uma falta de compreensão quanto ao conteúdo do Vipassana. Vipassana no contexto do Abhidharma quer dizer “sabedoria”. Sabedoria no Budismo é enxergar as coisas como elas realmente são e ver as coisas como elas realmente são, está relacionado com dois aspectos, da mesma forma que Vipassana.

A prática do Zen, Dhyana, tem dois aspectos. O primeiro aspecto é conhecer a realidade mundana como ela realmente se apresenta e o segundo aspecto é compreender de fato a realidade última. Nas escrituras também se pode encontrar Vipassana como a compreensão do nirvana. Na tradição do Theravadha, Vipassana é conhecido como a penetração nas características dos objetos de nossa experiência. Apenas quando você tiver penetrado na natureza última dos objetos de sua experiência, você será capaz de experenciar a natureza comum de todos os fenômenos e, a natureza última de todos os fenômenos de nossa experiência, é a impermanência.

O quer que seja experenciado na impermanência, é dukka. A tradução mais comum para dukka é sofrimento, mas não é um sofrimento relacionado com algo que seja somente doloroso físico ou emocionalmente pois, para o homem sábio, o verdadeiro significado é a impermanência. Essa não é a compreensão do homem comum. Está relacionado com a compreensão de tudo que compõe os fenômenos e tudo que compõe os fenômenos é de fato sofrimento. Tudo que experienciamos no mundo é esse compor. Quando você compreender isso, será possível compreender a realidade última, que é a ausência do “eu”. O que não possui um “eu” não pertence a ninguém, é vazio.

Na tradição do Abhidharma a realidade última está relacionada com os fatores mentais e a própria mente em si. Na tradição Abhidharma do norte, há uma diferenciação entre as formações mentais e a mente em si, isso também é considerado como realidade última.
(continua)

terça-feira, 20 de agosto de 2013

O estudo e a prática



Venerável Dhammadipa continua: Concordo com Genshô Sensei, o estudo não deve ser colocado de lado, existe uma tendência no Japão de separar completamente o estudo da prática e isso não é o que tem acontecido na China. Muitos dos grandes mestres do passado não foram somente grandes praticantes, mas também profundos estudiosos. Você deve ponderar os dois lados e nunca exagerar para lado nenhum. Minha posição é que há que combinar a prática, com o estudo. Fui afortunado que meus professores eram bons iogues e bons estudiosos. De acordo com o Budismo, há três tipos de sabedoria: a sabedoria de ouvir, a sabedoria de contemplar ou de meditar e a sabedoria de conectar-se diretamente com o Samadhi. A sabedoria do Budismo sempre esteve ligada a esses três tipos de sabedoria.
O Zen não é uma exceção. O tempo que determinamos para compreender o Zen deve ser o tempo que dedicamos para compreender todas as coisas. Quando compreendemos isso, compreendemos o quanto necessitamos de disciplina. Disciplina significa ver todas as coisas através do Dharma. Se fizermos isso, seremos bem sucedidos na prática do Dharma. Para ser uma prática útil, temos que olhar profundamente dentro disso e realizar uma prática integrada, é isso que foi enfatizado por todos os grandes mestres da China.

(Palestra no Daissen Ji, em Florianópolis, traduzida por Pedro San, decupada da gravação por Chudô San e revisada por Rachel San.)

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Não me fale dos atos de Buddha me mostre os seus atos



Venerável Dhammadipa continua: O nosso “eu” e nosso apego aos objetos implica na deposição de sementes nesse “Depósito de Consciências”, e por isso é chamado de Depósito, pelo fato dessas sementes estarem ali depositadas. Um aspecto subjetivo do Alayavijnana é chamado “Manas”, que é a autoconsciência. Essa autoconsciência é baseada numa consciência diferenciadora e desse modo, retornamos ao Samsara. Nós tomamos como reais essas diferenciações dos conceitos dos Manas que estão relacionados com o auto apego.

Comentário de Genshô Sensei: É através das sementes cármicas que depositamos em Alayavijnana, que surgem todas as consciências e estas é que fazem com que nos manifestemos no mundo.

Venerável Dhammadipa continua: O processo de liberação do Yogacara, que está diretamente relacionado ao Zen, é exatamente a transformação disso tudo em sabedoria. Sei que estão todos cansados, isso não é tão importante, são só teorias. O Zen está enraizado nas ideias de Yogacara.

Comentário de Genshô Sensei: Eu diria que o Zen tem uma “estética” do Yogacara, o que acontece é que ele não levou tão a sério a idéia de que todas as coisas existentes são apenas consciência. Onde o Zen se afastou do Yogacara, foi na idéia de que as coisas existem mesmo que não exista minha consciência olhando essas coisas. Não sou eu quem faço surgir as coisas, elas existem mesmo que eu não as observe. Essa é a abordagem do Zen. Para o Yogacara tudo é consciência e tudo só existe porque existe uma consciência que observa. Mas, como ele mesmo disse, isso é uma profunda teoria do Abhidharma e do Yogacara que é muito difícil de entender, é muito sofisticada.

Em geral, no Zen, escapamos dessa discussão levando o assunto para o terreno da praticidade e do agora. Algumas pessoas ficam muito interessadas na profundidade da filosofia Budista e desejam tanto se aprofundar nas minúcias filosóficas, que acabam por se afastar da verdadeira prática. O que o Zen propõe é sentar de frente para a parede, ou, quando eu mandá-lo fazer algo, você irá fazer sem discutir, e, caso você discuta, demonstra sua ignorância nos ensinamentos. Foi discutido por alguém que entendia, mas ele fala e você fica só fazendo jogos com palavras e não age corretamente no mundo. Isso é vazio. De nada adianta ser um grande mestre de teorias sobre o budismo e não saber se comportar no mundo. É isso que o Zen quer dizer, não me fale das palavras de Buda, me mostre suas palavras, não me fale dos atos de Buda, me mostre seus atos. É isso que chamamos de prática. Mas evidentemente desconsiderar a necessidade do estudo é o erro de cair no extremo oposto.

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

As coisas como elas são



Venerável Dhammadipa continua: Os sutras de Bodhidharma ensinam que há quatro tipos de Samadhi (concentração meditativa) - o primeiro seria o Samadhi do “não saber”. Esse tipo de Samadhi eu aprendi na Birmânia e no Sri Lanka e são muito enfatizados na Escola Theravada e na Yogacara. A Escola Yogacara se baseia no estudo do Samadhi dessa mesma forma. O segundo Samadhi seria o da “busca das coisas como elas são” e esse é o Samadhi que vocês estão praticando agora. Quando você realiza as coisas como elas realmente são você se torna nobre, ou seja, quando pode realmente compreender o objeto da liberação. Nos primórdios do Budismo, quando você realmente realizava o objeto da liberação, não podia continuar no Samsara (mundo da perambulação) por muito tempo. Como vocês sabem, a Escola Mahayana enfatiza a unidade do Samsara e do Nirvana. As escrituras do Mahayana ensinam que tanto o Samsara quanto o Nirvana não têm natureza própria, portanto não podem ser diferenciados. Por isso não é de costume usar o termo “Nirvana” mas sim “as coisas como elas são”. Nas “coisas como elas são”, de fato, bem e mal não têm qualquer diferença, ambos são como eles são. Esses são os meios hábeis para a prática do Bodhisattva e, sem entender isso, vocês não poderão entender a prática do Bodhisattva. Isso é também a base da experiência Zen - as coisas são como são e nesse âmbito todos os fenômenos são iguais.

Porque nesse âmbito todos os fenômenos são iguais? A Escola Yogacara enfatiza que a mente é esse âmbito de “as coisas como elas são”. A principal prática de meditação na Escola Yogacara é quanto à natureza da mente e ela não tem diferenciação, por isso que a mente tem a capacidade de captar todos os objetos, pois, se ela tivesse diferenciação, como poderia ser capaz de captar todos os objetos? A mente é para ser contemplada como o próprio espaço e, tal como o espaço tem lugar para tudo, com a natureza da mente é a mesma coisa. A transformação da mente é que será capaz de ver sujeito e objeto. Isso é muito importante de ser compreendido. A transformação ocorre de fato na mente em si e em nenhum outro lugar.

A mente no Yogacara pode ser compreendida em três aspectos: o primeiro é o sinal do objeto, por exemplo, supondo que alguém esteja lá fora, para que ele seja real, eu preciso de uma referência e, a partir dessa referência, eu passo a entender esse objeto como real. Nos apegarmos a essas referências dos objetos, é estar de fato no Samsara, é através desse apego que continuamos no Samsara. Isso implica de fato na base e na transformação da consciência em si. Quando experenciamos um objeto como real, temos essas referências de “sinal do objeto” e temos, então, o aspecto subjetivo da mente que entende essa realidade como essas referências do objeto. Após isso temos o aspecto do testemunho, esse aspecto do testemunho é denominado Alayavijnana (consciência depósito universal), que é onde se encontram todas as consciências. Esse conceito não é estranho à filosofia ocidental, Sócrates já dizia que para entender alguma coisa você precisa de suas experiências pregressas, ou seja, de suas lembranças.

Comentário de Genshô Sensei: a idéia de Alayavijnana é a de que não somente minhas lembranças ou consciência estão contidas nesse depósito, mas todas as experiências do universo inteiro, todo conhecimento, tudo que acontece no universo está contido em Alayavijnana, a questão é se posso ou não acessar esse depósito.
(continua)

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Samatha e Vipassana unidos


(Continuação)
Ven. Dhammadipa:   Mas como praticar então? O primeiro passo seria diferenciar e separar o nome da experiência em si e entender que não há existência própria nas coisas. Dessa forma, veremos essas diferenciações como uma ilusão. Isso é uma introdução aos ensinamentos do Yogacara. Não vou me estender muito, pois esse é um assunto vasto, o melhor é ter uma experiência Zen, pois o assunto do Abhidharma é muito vasto e complexo. Passei muito tempo estudando o Abhidharma, é muito fascinante e profundo, mas não é necessário que alguém o estude de forma tão profunda, mas essas idéias são importantes para a devida compreensão do Zen. O Budismo é Samatha e Vipassana e quando praticamos Yoga com um sentido de Budismo, tudo que fazemos deve estar relacionado com Samatha e Vipassana. Isso também é a base da prática Zen.

Nos primórdios do Budismo existia uma tendência a separar Samatha de Vipassana, mas o Mahayana enfatiza a prática de Samatha e Vipassana juntas. Nos tempos antigos do Budismo, tanto o Mahayana como Hinayana se focavam nos estágios profundos de concentração para depois usá-los para praticar Vipassana. O Mahayana enfatizou a experiência direta nas coisas tais como são.

Comentário: Existe uma palavra no português para isso que é “Talidade”: as coisas tais como são.

(Continua)

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

A Escola Yogacara e o Abhidharma


(continuação)
A Escola do Yogacara está baseada no Abhidharma e ele ensina a verdadeira característica dos objetos de nossa experiência. Quando analisamos os objetos de nossa experiência e a nossa experiência em si, percebemos que de fato a natureza dos objetos pode variar muito, por exemplo, as pessoas são muito apegadas a coisas como dinheiro. Quando vocês vêem uma nota de cem reais, reagem de forma diferente de quando vêem uma nota de dois reais. Para o cachorro preto do Sensei Genshô, não há diferença entre uma nota de cem e uma nota de dois reais, mas na realidade ele está experenciando a mesma coisa. Está experenciando a cor, experenciando a forma e, quando encosta seu focinho na nota poderá senti-la lisa e macia.

Da mesma forma que nós, quando ele levantar a nota, poderá senti-la leve. Mas a experiência dele é diferente, pois ele tem um conceito completamente diferente do nosso. Quando um cachorro vê um osso com restos de carne, seu rabo começa a abanar, mas nós vemos esse mesmo osso e podemos sentir repulsão. O Abhidharma estuda o verdadeiro conteúdo de nossas experiências, de fato ele é o mesmo para todas as criaturas, nós apenas o vemos diferente em razão de nossos conceitos diferentes.

De acordo com o Abhidharma, nós apenas vemos a impermanência momentânea de todos os fenômenos e de todas as experiências. Depois de você ter analisado as características, por exemplo, da terra, como dureza, maciez, leveza ou peso, são essas as características experienciadas e não outras. Da mesma forma, quando experienciamos o fogo, iremos experienciar a temperatura e nada mais, e isso será o mesmo para todas as criaturas. Esses são de fato os verdadeiros conteúdos de nossas experiências.

Mas não estamos apegados de fato à esses conteúdos, estamos, na realidade, apegados aos conceitos que criamos dessas coisas. Como esse copo, ele possui uma cor, uma forma e uma dureza. Ao tocá-lo eu experiencio um conteúdo frio porque minha mão está mais quente, isso é algo relativo, mas aparenta ser sempre o mesmo. Sempre que eu perceber o copo, irei experimentar esses elementos, mas não irei me apegar a isso e sim aos conceitos relacionados ao copo, como por exemplo, o fato de ser um belo copo do Japão. Isso é igual para todos os tipos de formas, como casas, carros e outros objetos, sempre iremos nos apegar aos conceitos, nós usamos nomes a assumimos que eles são reais e imutáveis.

O Abhidharma enfatiza que não é suficiente experimentar o conceito, você de fato tem que compreender a própria experiência. Quando você compreende o conceito, passa a entender a própria existência do fenômeno. Estamos presos ao Samsara porque damos realidade última às coisas. De acordo com os ensinamentos do Yogacara, isso nada mais é do que a transformação da mente, que tem uma natureza não dual, mas que se torna dual devido à essa noção de uma existência própria, que nada mais é do que a base de todo nosso apego.

Comentário de Genshô Sensei – O Abhidharma é terceira parte do Tripitaka, ou os três cestos. A primeira parte são os sutras, que são os discursos de Buda, a segunda é o Vinaya, que são as regras para os monges e a terceira que é o Abhidharma, são os comentários de mestres sobre os sutras e o Vinaya. É sobre isso que ele está falando.

Venerável Dhammadipa continua: A Yogacara pode ser considerada como um Abhidharma relacionada à Escola Mahayana. Originalmente não seria Mahayana, mas sim uma tradição da yoga no Budismo. De acordo com a tradição o Bodhisattva Maitreya, que é o fundador mítico da Escola Yogacara, teria revelado essa tradição aos Bodhisattvas Asanga e Vasubhandu, que eram irmãos.

Asanga explicava melhor a prática, enquanto Vasubhandu, a filosofia. De acordo com o Yogacara, todos os fenômenos que experenciamos como reais no mundo, estão relacionados à própria existência das coisas e das pessoas que conduzem à transformação da consciência. A consciência em si não tem nenhuma natureza dual, mas devido a essa transformação, torna-se dual, separando sujeito de objeto. Isso é muito importante de ser entendido e, de fato, é a base para o entendimento do Zen. Nosso entendimento do mundo vem desse entendimento da natureza dual das coisas. A consciência é, de fato, não dual em sua própria natureza. Tudo que existe no mundo, de acordo com a tradição Yogacara, está baseado no nosso apego à realidade das coisas e, as diferenciações que fazemos para compreender o mundo, são reais por pertencerem à mente, mas são de uma natureza não dual, são de uma natureza vazia, são a própria expressão do vazio e não existem separadas do vazio.

De acordo com o Yogacara, a verdadeira forma de entender a natureza da mente é entender que todas as experiências são, de fato, a transformação da consciência e que estão baseadas numa imposição de uma existência própria de todas as entidades. Isso nada mais é do que nos apegarmos ao nosso próprio “eu”.
(continua)

terça-feira, 13 de agosto de 2013

A escola Yogacara


PALESTRA do VENERÁVEL DHAMMADIPA

Florianópolis, 28.02.13

Não tenho nenhum tópico específico para falar hoje, mas eu gostaria de falar de coisas que são de interesse de todos nós. O pedido de Genshô Sensei foi que eu falasse sobre Yogacara que, na minha opinião, é uma das direções mais interessantes do Budismo e de grande relevância na tradição Zen.

Como vocês devem saber, há seis escolas no Budismo Chinês e a Escola Yogacara é uma delas. Esta Escola é baseada nos textos de transmissão de “Xuanzang Genzo” e na China não sobreviveu como uma tradição separada. No Japão há um único templo em Nara, que mantém essa tradição viva. Desta forma, a Escola Yogacara está quase extinta como uma tradição independente, mas é fortemente influente em quase todas as escolas do Budismo chinês. Infelizmente quase todo o trabalho que o Monge Xuanzang teve em traduzir os textos, não foi suficiente e devidamente estudado, e isso é uma grande perda para o Budismo.

A Escola Yogacara como o próprio nome diz, está muito próxima do conceito e da tradição da yoga e, de fato, é a própria transmissão dos yoguis dos tempos remotos para os atuais. Como vocês sabem, toda a prática da yoga é voltada para a própria mente, para o lado interior do praticante, isoladamente da influência dos cinco sentidos. O verdadeiro significado do Dharma e da yoga, só pode ser verdadeiramente entendido quando nos voltamos para dentro. Esse também é o principal caminho do Zen. De acordo com o Zen, assim como na yoga, você primeiramente tem que realizar uma mente imóvel. A prática de manter uma mente imóvel é o principal objetivo.

No Zen, além da mente imóvel, existe um aspecto a mais que é realizar e entender que todas as coisas são da natureza da própria mente. Isso é precisamente a base das fundações da Escola Yogacara. A particularidade da Escola Yogacara é que todos os objetos são objetos da mente, ou seja, criados pela mente. Todas as nossas experiências são, de fato, experiências da mente. Isso não foi muitas vezes bem entendido e consequentemente criticado.

Temos que entender que a yoga, assim como o Zen, são inseparáveis da tradição do Yogacara. O Buda Dharma, assim como o Buda Yoga, enfatizam que todos os ensinamentos são meios hábeis para a realização, logo, o entendimento desses ensinamentos também é um meio hábil a nos guiar na prática e é possivelmente um dos meios hábeis mais poderosos nesse sentido.

Os princípios do Yogacara estão baseados nos primeiros escritos originais do Budismo, os “Agamas”. Eles ensinam que a mente é estrangeira a todos os fenômenos e eles são guiados por ela. Na literatura Budista, vocês encontrarão versos como: “O mundo é guiado pela mente e todos os fenômenos estão sob seu poder”. Todos os fenômenos e nossas experiências são guiados pela mente. Os fenômenos são guiados pela mente, no sentido de que damos nomes às coisas e, quando damos nomes às coisas, acreditamos que a realidade corresponde a esses nomes e aos conceitos a eles relacionados. Na realidade, os conceitos que temos são um subproduto de nosso carma. Temos diferentes conceitos porque temos diferentes carmas.

Inicialmente quando vemos um objeto pela primeira vez, o vemos com desejo, ao passo que podemos vê-lo mais tarde com desgosto e depois de mais um tempo com desilusão. Da mesma forma, acreditamos que o objeto está ali porque damos um nome a ele, dessa forma, claramente estamos vivendo sob o poder dos conceitos. Mesmo que não estejamos conscientes deles, eles estão governando nossa mente.  (continua)

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

A quem repassar a lâmpada?




P: Por que o Zen é chamado de método direto ou o caminho direto? 
 
Monge Genshô – Normalmente as escolas Budistas têm caminhos graduais onde o aluno quando chega à escola é incentivado a pegar um terço e repetir um mantra ou estudar sutras, no Budismo Tibetano se chama “Sadhana”, uma tarefa como repetir uma recitação longa, simbólica e instrutiva, e o aluno tem que repetir, por exemplo, 100 mil vezes um mantra. O aluno vai evoluindo de tarefa em tarefa e existe um período preparatório, um período avançado, em algumas escolas existem também iniciações. Também existe o compromisso do aluno que passa pra uma fase acima, de não falar sobre as iniciações para os alunos de fases anteriores, é um método escalonado e secreto.
 O Zen em sua história se expandiu em países já Budistas, normalmente o Mestre ficava  num mosteiro ou eremitério e o aluno tinha que ir até ele. Este aluno muitas vezes já havia percorrido um longo caminho espiritual, já era um praticante severo de outras escolas. No Zen, os mestres tinham pouquíssimos discípulos, fato que se mantém até hoje. Alunos são muitos, discípulos são poucos. O Zen pegava o aluno e partia diretamente para um método quebrador, um nível mais alto sem estágios intermediários. Essa é a tradição, os alunos vêm e não encontram nada de secreto, só esse desconforto de não ter onde se agarrar e os mestres estão a procura de discípulos, alunos a quem possam dar a transmissão, pessoas a quem repassar a lâmpada.

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

A cada passo fazemos o caminho



Alguém escreveu outro dia dizendo que tudo estava dentro de você mesmo e que não é necessário professor para encontrar as respostas dentro de si mesmo. Esse é um mito pois, por exemplo, se você tentar aprender música sozinho, nunca passará de um amador terrível, com posturas e vícios errados. Isso é uma imensa vaidade, o caminho espiritual não é fácil. Eu estou no Zen há quarenta anos e ainda faço perguntas para meu Mestre. Ninguém anda sozinho, precisamos da ajuda dos outros, dos mestres, escolas e métodos.

  P:   É correto dizer que se está buscando o caminho?

Monge Genshô – O caminho se constrói a cada passo. Você não está buscando um caminho, você está fazendo o caminho. A cada passo você está fazendo seu caminho e amanhã o passo muda. Se você passar a pensar que o Zen é um lugar muito cruel, mude de caminho. O Zen não é o possuidor da verdade e nem há nenhuma crença que possamos dizer que seja certa ou verdadeira, o Zen é um método que serve para algumas pessoas, para outras pessoas existem outros sistemas mais apropriados.

Um mestre do passado disse em resposta a um aluno: “Eu gostaria de te dar alguma coisa, mas só tenho uma bola de ferro incandescente para ser engolida”. A vida é cheia de oportunidades e conhecer o budismo é uma rara oportunidade, pois nem todas as pessoas se sentem atraídas por algo desse tipo. O Zen atrai um tipo de pessoa que não quer mais muletas psicológicas e está focado em esforço próprio, não em ilusões. Qualquer pessoa que vá até o Hattô (templo) e faça prostrações para a estátua de Buda é um herege e ignorante, não fazemos prostrações para a estátua de Buda. A estátua é de gesso, pedra ou madeira e Buda foi um homem como nós. Fazemos prostrações para acabar com nosso orgulho de não sermos capazes de ajoelhar, o fazemos para agradecer o Dharma que nos foi transmitido com o esforço de muitos mestres da linhagem a começar por Shakyamuni Buda.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Pouco treinamento, pouco resultado



P: Quando estou praticando, não sei dizer se é concentração, mas sinto um pequeno grau de desprendimento, nada profundo ainda, esse estágio mental é uma espécie de treinamento para que eu possa desenvolver esse outro nível?

Monge Genshô – Temos muitos pequenos graus, mas na realidade quarenta minutos são muito pouco. Os leigos vêm praticar, sentam quarenta minutos e pensam que estão praticando meditação. O correto seria eu dizer que estão “fazendo uma limpeza”, estão se acalmando, não é tempo suficiente para ir mais fundo. Por isso sempre aconselho as pessoas a irem aos retiros. Nos retiros são muitas horas de meditação e é comum essa sensação no primeiro dia, de estarmos descartando o lixo. Como agora, sentados ali no zendo, vem à mente aquelas coisas que perturbaram você durante o dia de hoje ou de ontem, ou mesmo que vem perturbando durante dias, mas para ir mais fundo no Zen tornam-se necessárias muitas horas mais de prática.

No segundo dia de retiro estamos desesperados e querendo ir embora e se passarmos por essa fase, a vontade de ficar substitui a ânsia de sair do retiro. Isso pode aumentar se tivermos algum tipo de experiência e então voltar para o mundo dito real é que parece loucura, pois ali no retiro temos paz, serenidade e clareza. Pode ser que você não consiga isso, mas normalmente é o que acontece. Existe um retiro de oito dias, chama-se “rohatsu”, em que você não pára durante sete dias e, no último dia, à noite, o retiro vai até a madrugada sem intervalos. É o “retiro da iluminação de Buda”, pois foi isso que Buda fez. Toda essa história dos retiros, é somente pra dizer que pouca meditação, é igual a pouco resultado. Se você senta só um pouco por dia ou por semana, sempre será só um pouco, e pouco treinamento, pouco resultado.

Uma vez disse ao meu Mestre que queria dar um passo mais adiante e ele me disse para ficar sozinho durante três dias, não falar com ninguém, não ver ninguém e só sentar durante esse tempo. Eu lhe perguntei como havia sido com ele e ele respondeu que quando era jovem queria resolver a questão do “vazio é forma e forma é vazio”, então se sentou por quatro anos. Resolveu.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

O mal e o bem, o bom e o mau



P:  Uma vez foi dito que nossa prática começa no nível da virtude até atingir o nível da compaixão. Quais são as etapas desde o nível da virtude?

Monge Genshô – Essa é uma forma didática de divisão.

A primeira é a prática da virtude e por isso tem regras como não matar, não roubar, não causar sofrimento, não usar substâncias que alterem a consciência. Como não temos o conceito de pecado, no entendimento budista, esses preceitos ou regras têm como objetivo a diminuição do sofrimento, tanto seu como de outros seres.

Depois de praticar desta forma por muito tempo, temos o segundo estágio que é o desenvolvimento de uma mente compassiva. Quem tem  mente compassiva não precisa das regras, pois matar, roubar e causar sofrimento não lhe é natural, e quanto mais cresce sua compaixão mais ela se estende a todos os seres e até mesmo as plantas, pedras e rios.  Para ele não existe a opção de causar sofrimento, ele tudo faz para evita-lo, na verdade vai mais fundo do que as próprias regras agindo com desprendimento e sentindo a dor dos outros como se fosse sua.

O terceiro estágio é o da não dualidade, onde não existem julgamentos e há equanimidade. Porém, não se pode cogitar a equanimidade sem passar pelos estágios anteriores. Algumas pessoas conhecem o Zen, começam a praticar e ler livros e querem falar sobre a não dualidade ou declarar que não existe o mal e o bem, que não há pessoas más nem boas,  que é impossível ser bom ou mau. Isto é ter entendimento zero sobre o caminho budista. A não dualidade é o desenvolvimento de uma mente não classificatória nem discriminativa, mas ela engloba os passos anteriores e só pode surgir em uma mente que já foi tomada inteiramente pela compaixão a tal ponto que a distância "eu e os outros" desapareceu, é ainda mais profunda que a mente compassiva. Ninguém que não tenha passado pelos estágios anteriores pode falar sobre não dualidade.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Podcast - Entrevista "Sobre budismo"

Podcast - Entrevista "Sobre budismo"

Um grão de mostarda



Meses atrás soube que um neto meu com um ano e oito meses de idade está com câncer. Isso não significa que eu pense que posso solicitar ajudas sobrenaturais, mas sim que ele deve ser internado, fazer quimioterapia e que todos à sua volta sofrerão.  O que devemos fazer com a dor e o sofrimento? Vivê-los e enfrentá-los completamente, sabendo que a vida se mostra a cada passo e que ao longo da história muitas pessoas já sofreram muito mais que nós. Todos nesta sala são muito bem alimentados e jamais enfrentaram uma guerra, é mais sofrimento do que podemos entender.

Em 1945 logo depois da Segunda Guerra, em Berlim 50% das mulheres foram estupradas pelos soviéticos como ato de vingança dos horrores que por sua vez os nazistas haviam cometido em suas terras. Das crianças nascidas em 1946, 80% ou 90% morreram, porque a ração destinada às pessoas que não trabalhavam, no caso as mães, era de trezentos gramas de pão e cento e cinquenta gramas de banha por dia. As pessoas ficavam deitadas para não gastar energia, mas como a temperatura caía a -20 graus as pessoas morriam congeladas. Quando ficamos sabendo destes fatos, vemos que os sofrimentos individuais que enfrentamos não são nada se comparados aos sofrimentos que já aconteceram na história da humanidade e ocorrem hoje em países convulsionados. São sofrimentos muito mais intensos e maiores do que podemos sequer imaginar.

O ensinamento deve ser: “é possível sofrer galhardamente sem se importar”? Não, você irá sofrer de verdade e sofra sinceramente se houver, de fato, sofrimento. Você não será salvo do sofrimento por nada sobrenatural, só pela fortaleza que você será capaz de criar, através de sua lucidez.

O ensinamento Zen é duro porque as pessoas procuram consolo nas religiões e o Budismo não oferece consolo. Quando uma mulher foi até Buda com um filho morto no colo pedindo à Buda que o ressuscitasse, Buda disse que o faria desde que ela lhe trouxesse um grão de mostarda de uma casa em cuja família nunca tivesse morrido ninguém. Desta forma ele ensinou que o sofrimento faz parte do mundo.

Por que então fazemos cerimônias para os doentes e falecidos? Para benefício de todos os que sofrem e de todos os vivos naturalmente.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Ninguém lá fora para nos ajudar



Estava fazendo uma palestra  e uma senhora disse que era inaceitável que disséssemos no Zen que não havia ninguém lá fora para nos ajudar. Eu a compreendo, é realmente muito difícil de aceitar essa postura, mas para o Zen só podemos contar com nós mesmos.

Mas somos imensamente poderosos no sentido de que podemos construir nosso próprio futuro, podemos alterar nosso carma e um homem pode provocar tremendas mudanças no mundo. Ela insistiu com sua indignação citando os arcanjos e anjos. Se houvesse alguém que tivesse o poder de ajudar, tivesse compaixão, fosse bondoso e tivesse sabedoria para ajudar, porque ele esperaria você pedir? Eu imagino que se meu filho caísse, não esperaria que ele me implorasse ajuda. Algum de vocês faria isso, algum de vocês diria que só ajudaria se lhe fosse pedido? Alguém diria para seu filho caído: “Se eu ajudar você, você promete se comportar e estudar”? “Ajudo só se você pedir com fé” ?

Se Buda tivesse o poder de nos ajudar não precisaríamos pedir para ele, já estaria nos ajudando. Alguém que desenvolveu compaixão não espera, então, imaginarmos que existam seres de sabedoria e bondosos lá fora, a quem precisemos orar ou pagar para que nos ajudem, é uma tolice nossa.

Não parece que é assim que o universo funciona, ele funciona com ações e conseqüências. Fazemos coisas e obtemos resultados. Orar é algo bom, pois as pessoas que oram constroem mentes melhores e criam modificações. Não somos Zen Budistas para acreditar ou pedir algo para alguém, por isso sentamos, e sentar é muito difícil. Tratamos de cuidar de nossas mentes para que elas sejam melhores, mais sábias, com mais clareza e lucidez, sem se agarrar em fantasias. A tarefa dos Mestres é destruir as crenças e fantasias, desconstruir e tirar tudo a que as pessoas possam se agarrar. Só assim os seres poderão ser livres. Por isso Buda disse: “Não acreditem em mim, testem e experimentem”. Vocês podem mudar suas mentes através da prática, mas não podem mudar o mundo através do “esperar que poderes sobrenaturais os socorram”.

sábado, 3 de agosto de 2013

Conto infantil de Saikawa Roshi - "Taro"


Taro era um peixe-escorpião que nasceu no mar do Japão, na região sul, onde as águas  são quentes.
Dizia a lenda que as "águas da vida" ficavam na mesma região do mar que Taro habitava.
Acreditava-se que essas águas ofereciam vida e carinho.
Além disso, elas acalmavam a mente. As "águas da vida" davam a maior felicidade do mundo.
Ao menos uma vez na vida de cada criatura, surgia o sonho no qual ela fazia uma jornada em busca da "água da vida".
Mesmo assim, quase todo mundo desistia da jornada e voltava para casa sem jamais encontrar nada.
Acontece que Taro, o peixe-escorpião, era mais curioso que a maioria e vivia à procura de aventuras.


Ilustração Dosho Saikawa
Ilustração feita pelo monge Saikawa
Ilustração feita pelo mestre Saikawa Roshi

Certo dia, ele decidiu que não voltaria para sua casa até encontrar a "água da vida".
E lá foi ele percorrer sua longa jornada em busca das águas lendárias.
Taro foi até o mar do Equador.
Acreditava-se que era o lugar mais quente da terra.
Ao buscar pela "água da vida", ele não só foi ao Polo Norte, como também ao Polo Sul, um dos locais mais gelados do mundo.
Taro nadava de um continente ao outro levado pela correnteza oceânica.
Certo dia, ele perguntou a uma água-viva que viajava o mundo inteiro deslizando pelas ondas.
- Você sabe onde posso encontrar a "água da vida"?
E a água-viva respondeu:
- Não faço a menor ideia - e não mostrou interesse pelo assunto.
Certa vez, Taro foi perseguido por um tubarão.
Outro dia, foi quase engolido por uma baleia.
Então, Taro nadou até o mais fundo do mar para perguntar ao peixe-pescador-de-mar-profundo, que traz uma lanterna na cabeça, se ele sabia onde encontrar a "água da vida". O Peixe-pescador-de-mar-profundo respondeu com sua voz rouca, ressoando como o rumor do solo:
- Não sei.
Em seguida, Taro nadou em direção à lula para lhe perguntar sobre a "água da vida" que ele tanto buscava.
Mas a lula espirrou sua tinta negra em Taro e ele não conseguiu enxergar mais nada.
Taro seguiu em sua jornada em busca da "água da vida" por muitos e muitos anos, sem encontrá-la.
Decepcionado, Taro finalmente desistiu e tomou o rumo de volta ao seu mar de origem.
Mas algo aconteceu quando ele se aproximou de sua casa.
Taro chegou a um lugar no qual o solo arenoso começou a subir.
Mesmo longe da praia, a água ficava mais rasa.
Repentinamente, uma onda enorme ergueu-se e lançou Taro para fora da água.
Metade do corpo de Taro ficou fora do mar.
Foi então que ele avistou um mundo diferente de tudo que já vira antes.
Nesse momento, ele perdeu o fôlego e não conseguia mais respirar.
Foi então que compreendeu tudo muito claramente.
Agora ele percebia que estivera dentro da "água da vida" desde seu nascimento.
Taro, que regressou ao seu mar de origem, revelou a todos o segredo que finalmente descobrira.
Mas ninguém acreditou nele.
Os peixes ficavam só lhe perguntando:
- Onde fica a "água da vida"? Mostre para nós!
Sempre que alguém lhe fazia essa pergunta, Taro colhia a água ao seu redor e esticava as nadadeiras para entregar-lhes a "Água da Vida" dizendo assim:
- Aqui está ela!
Os peixes riam e riam sem jamais aceitar as águas que  lhes eram oferecidas.
(isso porque todos viviam na água mesmo e, para eles, isso não era nada de especial no final).
Mesmo que ninguém acreditasse no que ele dizia, Taro tentou mostrar-lhes o que era a "água da vida".
Ele disse:
- Eu finalmente encontrei a "água da vida", então agora eu me sinto satisfeito e muito aliviado.
Mas ninguém parecia compreendê-lo.
Taro lhes disse então que agora, o que ele mais detestava no mundo, eram as brigas.
E que nunca mais discutiria com ninguém, porque agora ele pertencia a todos e a tudo.
Como então poderia brigar com os outros?
Taro estava sempre sorrindo e nunca mais se envolveu em conflitos.
Ele foi ficando cada vez mais velho.
E finalmente chegou o dia de seu último suspiro.
Nisso, ele disse a todos que o cercavam:
- A verdade é que todos nós somos a "água da vida".
Por toda a parte, nos rochedos, nos corais, nas algas marinhas, em todos vocês, em mim, no meu corpo após minha morte e nos peixinhos que virão a nascer de agora em diante, haverá a "água da vida".
Todos os peixes choraram e disseram:
- Por favor, Taro, não vá embora! Nós não entendemos nada sobre a "água da vida", você ficava tentando fazer com que a percebêssemos e nós nos sentíamos tão alegres e leves ao seu lado!
- Por favor, não vá embora! - eles pediam e choravam.
Taro respondeu:
- Eu nunca irei a lugar algum. Eu sempre estarei com vocês. Vocês não precisam preocupar-se com nada. Porque tudo é a própria "água da vida".
Estas foram suas últimas palavras. Então, Taro prosseguiu em sua jornada rumo a "água da vida" com um sorriso suave.

(Publicado originalmente na Folha de SP)

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Olhar para a frente




P: Hoje é muito comum ouvir a expressão “Aquela pessoa é Zen”. Mas pelo que escuto sobre os retiros e práticas Zen, não é nada fácil, ou seja, não é o que é dito como Zen.
 
Monge Genshô – Na verdade o treinamento do Zen é muito duro. Se não fosse duro não seria Zen. É duro e com grande sofrimento físico e mental. Mas só dessa forma você consegue se libertar. Os professores do Zen costumam ser severos. Lembro-me de uma pequena história com Moriyama Roshi, que foi meu professor. Uma senhora foi conversar com ele sobre sua separação e começou a falar do marido, da traição e de toda a tristeza que estava vivendo. Então o mestre olhou para ela e disse, “Agora vai ter que trabalhar, não é?”. Qual a realidade do momento, de que interessa tudo aquilo que aconteceu? Está sozinha e terá que trabalhar, essa é a parte que realmente interessa. Foi a própria pessoa que me contou isso e disse que foi como se tivesse levado uma bofetada. Assim é o Zen. 
 

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Ensinamento é útil mas não é o zen



P: Qual o papel da arte no pensamento Budista?

Monge Genshô – A arte é uma expressão humana. As artes foram e ainda são muito influenciadas pelo Zen. As artes marciais, artes plásticas e tantas outras sofreram forte influência do Zen. No Japão isso é muito marcante no Ikebana, nas artes marciais etc. todos fortemente influenciados pelo Zen. Muitas dessas artes foram introduzidas por mestres Budistas como meio hábil para ensinar o Zen usando a estética, usando algo palpável.

O Zen é muito influente principalmente nas artes chinesas e japonesas. Existe uma grande procura por espontaneidade. A arte dessa camiseta, por exemplo, é facilmente identificável, um homem sentado meditando frente à lua. Esse tipo de arte é feita num único traço onde não existe espaço para correções, tem que ser uma pincelada perfeita. A arte Zen é assim, espontânea e minimalista, tentando mostrar uma mente se expressando em um momento único, sem correções e disfarces.

P: Isso é como o sumi-ê. Quando fiz um curso de sumi-ê a professora disse que não pode haver correções, os traços devem ser únicos e firmes. Então perguntei como fazer para não cometer erros? Ela disse: treinando.

Monge Genshô – Exatamente, treinar até conseguir expressar sem correções. É como uma palestra sobre Zen como essa, ela não foi preparada, não existem perguntas elaboradas e ensaiadas para que as respostas saiam certas. As respostas devem sair naturalmente. Ou está pronto ou não está.

P: Mas existem métodos, como hoje fizemos zazen...

Monge Genshô – Exato, o Budismo em sua essência é um método. Cada escola tem o seu. O Zen enfatiza o método do sentar em silêncio, logo, o método predominante do Zen é o zazen, a meditação sentada e silenciosa. Se você tirar o zazen, deixa de ser Zen. Muitas pessoas pensam que sabem muito sobre o Zen porque leram muito livros, mas não sabem nada. Isso é como alguém que diz que sabe piano. Quando perguntado se toca ele responde, “Não, mas já li muitas partituras e biografias dos compositores”. O Zen é assim, você senta e faz o Zen, a explicação é interessante, mas não é o Zen.