quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

A justificação



Pergunta – Existe algum tipo de prática para durante o dia, com os olhos abertos?

Monge Genshô – Durante o dia? Claro. Experimente andar na praça durante o dia e olhar para as árvores e entre em samadhi ( concentração). Por que não? Existem muitas oportunidades de prática durante o dia para samadhi, para olhar para sua mente. Você precisa observar sua mente. Por que eu agi dessa forma? Qual o sentimento que me leva a agir dessa forma quando alguém me diz alguma coisa? O que me leva a justificar-me constantemente? Por que as pessoas fazem isso? Por exemplo, uma pessoa escorrega e quase cai. O que acontece? A reação, em geral é: “Ah, mas esse chão molhado, sem uma placa!”, ou “Ah, essa calçada mal feita!”. A culpa é sempre dos outros, nunca é você que não prestou atenção ao chão molhado e não caminhou mais cuidadosamente. Sempre nos justificamos e culpamos os outros. Isso, nos mosteiros, é facilmente aprendido, pois nenhuma justificativa é permitida.

 A justificativa é sempre a defesa do ego, mesmo que você tenha razão. No mosteiro, se você for repreendido injustamente, você simplesmente diz: “hai”, ou seja, “sim”, mesmo que o autor do erro tenha sido outra pessoa. Ser capaz de fazer isso sem se justificar, aceitar toda a injustiça, isso é realmente importante, mas é muito difícil. Para fazê-lo, é necessário esquecer-se de si mesmo. Enquanto eu quiser defender meu ego, minha vaidade e minha imagem, o prêmio se justifica. Por isso, é admirável quando uma pessoa, tendo algo de errado acontecido, chama para si a responsabilidade, assumindo a culpa - embora a gente saiba que a culpa não é só dela, pois existe todo um grupo na execução da tarefa. Ao assumir a culpa, ela encerra a discussão, pois não existem motivos para continuar a conversa. Se existe a justificativa, existirá a réplica e também a tréplica, e todo o carma continua. 

Então, quando a gente vê alguém assumir o erro, mesmo não sendo seu, isso é uma grande coisa. Já assisti várias vezes Saikawa Roshi pedir desculpas e assumir algum erro como sendo seu. Uma vez, em minha casa, minha esposa reclamou que eu havia ido para um angô (retiro de meses) e ela teve muitos problemas por ter ficado sozinha. Então Saikawa Roshi baixou a cabeça e lhe disse: “Me desculpe”. 
Ele não tinha culpa alguma, seu trabalho é formar seus discípulos, mas ele viu que havia sofrimento ali.
Ele retira dos outros e assume para si a culpa. Essa é uma demonstração muito importante desse tipo de visão a respeito das coisas. Monges noviços têm dificuldades nesse sentido, pois, sempre que são questionados, tendem a dar explicações ou justificar-se.