Daí surge um Sutra muito importante que
é o Sutra de Vimalakirti, que é sobre um comerciante. Esse é um Sutra do Séc. I
e marca o momento em que o budismo mahayana se distancia do movimento anterior,
porque transforma em herói, em iluminado, em melhor que os monges, um
comerciante. O Sutra diz que todos podem ser Bodhisattvas, inclusive os
deputados, senadores, etc. Se quiserem, se tiverem a conduta adequada podem ser
Bodhisattvas e beneficiar todos os seres. Não é intrínseco ao papel de leigo
uma dificuldade, mas o que importa é a sua atitude.
Vimalakirti diz aos discípulos de Buda:
“meu mosteiro é na cidade, o seu é na montanha, mas o meu é lá onde estão as
pessoas que precisam de dinheiro e de comida, é lá que eu trabalho”. Ao fazer
isso, ele acusa implicitamente os discípulos de Buda, os monges, de serem
parasitas sociais e de estarem apenas recebendo da comunidade sem alimentá-la,
sem retribuir a ela com o seu trabalho, o que é diferente do que ele faz. Esse
é o grande momento do Sutra.
Então é um Sutra combativo na sua
declaração, e depois dele vem uma conciliação, através do Sutra do Lótus, que
tenta acalmar essa situação dizendo que os monges têm um papel, que os leigos
têm outro papel e que nós podemos conciliar isto. Esse Sutra também se torna
muito importante dentro do movimento mahayana.
A essência de tudo isso que estamos
falando é de que a prática budista é possível dentro do mundo, dentro do
trabalho, e isto é uma marca da nossa própria comunidade budista Daissen-Ji,
porque eu mesmo, que a fundei, ainda trabalho hoje. Trabalho como monge e
trabalho como consultor de empresas para poder viver, então não vivo do que a
sangha dá, e sim baseio a minha sobrevivência num trabalho profissional. Estou
inserido no mundo, então o nosso modelo é o de Vimalakirti, esse grande
personagem deste Sutra histórico.
Ao mesmo tempo, nós tentamos conciliar
o trabalho dos monges com o trabalho dos leigos, que é um trabalho
importantíssimo, porque sem os leigos nós não conseguimos fazer as sanghas
funcionarem. Os monges são muito poucos dentro de um modelo como esse e isso
exige um enorme sacrifício, que é o de trabalhar duplamente.
[Trecho de palestra proferida por Meihô Genshô Sensei]