quarta-feira, 12 de junho de 2013

Os que tem certeza que estão certos



Filhas de Mara. Mara é quem representa alegoricamente o “mal”. E as filhas de Mara são essas paixões que arrastam Buda. Ele recusa todas as paixões, mas no fim tem uma maior que todas, um problema, e este problema surge perante Buda com o rosto dele mesmo e ele diz – “Tu não me enganarás mais” – e quando ele diz isso, essa figura com o rosto dele mesmo, se transforma em Mara, o senhor do mal.

Então esse grande mal que está dentro de nós e que frequentemente derrota os homens, é ele mesmo, o “eu”, o ego, o amor a si mesmo. Por isso Dogen diz – “Estudar o zen é estudar a si mesmo, estudar a si mesmo é esquecer-se de si mesmo, esquecer de si mesmo é ser iluminado por todas as coisas”. Então, enquanto nós temos um “eu mesmo” dentro de nós, ele nos atrapalha demais, por que esse “eu”, esse ego, é ele quem se ofende com o que os outros fazem, é ele quem quer impor sua opinião, é ele quem pensa que sabe o que é o certo e que pensa que os outros estão errados.

 Os que mais causam mal à humanidade são os que têm certeza que estão certos. Eles estão dispostos a qualquer coisa para provar isto. Kadafi (palestra ministrada antes de sua queda N.A.) está disposto a qualquer coisa para preservar seu poder, as suas idéias, os seus livros, a sua família, não importam as mortes, não importam os bombardeios, quantas pessoas irão morrer, quantos ficarão aleijados, não importa que o país inteiro seja destruído, desde que ele se conserve no poder. Porque ele está convicto de que  tem razão e que é amado por seu povo.

 Assad na Síria, ontem, fez suas tropas matarem cento e doze pessoas. Hoje foram os funerais. Suas tropas atiraram nas pessoas que estavam nos funerais. Mais cedo ou mais tarde, Kadafi e Assad vão sair do poder, serão depostos, talvez enforcados, talvez queimados vivos, quem sabe o vai acontecer com eles? Talvez fujam e sejam acolhidos em algum outro lugar para poder viver com seu dinheiro, mas atrás deles fica um grande rastro de destruição, por que eles têm grandes egos e têm certeza que estão certos.

Na realidade, falar sobre isso me entristece, mas eu vejo isso sempre se repetindo em todos os lugares. A convicção do “eu”, “meu eu”, “meu ego”. Meu ego se ofende se irrita quando não concordam com ele. Meu ego quer impor sua opinião, meu ego quer que os outros se dobrem ao que eu penso. E não há medida no esforço e na violência que as pessoas estão dispostas a empregar para isso. E essa é a história da nossa humanidade, história das ditaduras. Nós sabemos o que é o melhor, nós sabemos o que está certo. E não importa se são ditaduras de direita ou de esquerda. O mal, os horrores continuam, são os mesmos, porque  tem certeza que tem razão. Então se têm razão, podem impor sua opinião, e todas as revoluções acabam dando no mesmo, donos de poder que não o largam.

Cada um de nós deve, quando pensa que tem razão, fazer um exame, olhar para dentro de si e perguntar – “Quem é esse que pensa que tem razão, quem é esse que está disposto a discutir, que é esse que se ofendeu, quem é esse que está irritado, quem é”? Daí vocês irão olhar dentro de si e verão Mara, vão ver a pior parte de si, cheia de vaidade, cheia de orgulho e disposto a destruir o mundo em prol de si mesmos.

A Sangha também tem todos esses males, afinal, é constituída de pessoas. E as pessoas às vezes se irritam, perdem a paciência, se encantam com qualquer título ou poder. Desde o tempo de Buda, aconteceram sérios problemas. Uma vez Buda estava com seus discípulos e eles se desentenderam tanto, brigaram tanto que Buda se levantou e disse – Eu vou embora! – Então se levantou e foi embora para outro lugar. Disse – Se vocês querem brigar, então fiquem aí - e foi embora. E seus discípulos perceberam que sem Buda eles ficavam sem liderança, estavam perdidos. Então foram atrás de Buda e pediram desculpas.