segunda-feira, 26 de maio de 2014
Para conversar procuremos as similaridades
Pergunta – Me identifico muito com o budismo, por isso estou aqui, mas é possível seguir o budismo tendo outra religião?
Monge Genshô – As técnicas de meditação sim. Mas se formos aprofundando a prática e os conhecimentos, vai ficando incompatível, por exemplo, o budismo não considera a existência de um deus criador. Em determinado momento a pessoa terá que escolher. Do ponto de vista místico ou virtuoso, as diferenças são poucas. Se você comparar os mandamentos bíblicos com os preceitos budistas, eles são em espírito praticamente os mesmos, com algumas diferenças, é claro, por exemplo, o budismo não vê no sexo um pecado, o preceito é “não usar sua sexualidade de forma a causar sofrimento”. Se você, como forma de castigar sua esposa ou marido, se recusar a fazer sexo com ela ou ele, está causando sofrimento, e é errado.
No cristianismo, por exemplo, todos nascem com um pecado original e necessitam ser batizadas para tirar esse pecado. No budismo não existe o conceito de pecado, muito menos de um pecado original. O budismo vê ação e consequência, cada ato seu terá retorno e não há um deus que irá lhe castigar, você é quem terá que lidar com seus erros, pois também não há ninguém para absolvê-lo de seus atos errados. Outro conceito inexistente no budismo é a visão eternalista da alma, no budismo nada eterno existe. Está em suas mãos mudar tanto essa vida como as outras que virão, mas que não será você mesmo. São muitas diferenças.
Pergunta – Na verdade eu pensava mais na questão das transmissões de Jesus sobre o amor, como amar à Deus sobre todas as coisas...
Monge Genshô – Pois então, aí já começa uma diferença aguda, não amamos um deus lá fora e que pode nos salvar ou algo parecido. Temos que amar à todos os seres e pessoas e sermos compassivos, não poderia haver um povo escolhido com direito a matar e conquistar outros, na realidade, como falei antes, “eu” e “outro” não existe. Se eu ando com um amigo cristão e conversamos superficialmente sobre as similaridades do budismo e cristianismo, nos daremos muito bem.
Pergunta – Uma sensação que tenho é que no inicio de minha prática parecia que havia uma grande evolução e agora pareço estacionado sem avançar muito, isso é normal?
Monge Genshô – Isso acontece com quase todas as pessoas quando iniciam sua prática do Dharma, tudo parece maravilhoso e que há um grande progresso. Depois parece que há uma parede de ferro na sua frente e é impossível avançar um passo sequer. É preciso entender que é assim mesmo, caso contrário nos sentiremos desmotivados para continuar. É muito bom quando você fala para seu mestre que não sabe mais porque senta, uma vez que não consegue mais avançar, mas continua mesmo assim, é sinal que você desistiu dos seus objetivos.
Pergunta – Às vezes a gente percebe que uma pessoa fala tolices por falar, mas outras vezes as coisas ditas podem prejudicar a sangha, o que devemos fazer?
Monge Genshô – Você pode contestar essa pessoa e dessa forma todos terão a oportunidade de aprender, é como falei no começo, a sangha é como arroz no pilão. A sangha é um lugar de harmonia, mas isso não significa que não deva haver atrito, isso tem que existir. Para que existir sangha se todas as pessoas fossem maravilhosas? É como ir ao hospital e ler na fachada, “Casa de Saúde” e você perguntar como pode ser casa de saúde se todos aqui dentro estão doentes? Todos que vêm à sangha têm sofrimento, senão não viriam. Se vocês estão aqui é porque não são iluminados. Parece-me lógico que tenhamos conflitos e atritos. Mas isso deve ser feito com sentimento de compaixão e amorosidade e não com raiva.