(Continuação
da Palestra de Monge Komyô em Goiânia, outubro/2014):
Eu falei hoje mais cedo que o ZEN é muito direto e
não finge, não disfarça as coisas. Então as dificuldades, os nossos sofrimentos
e obstáculos, eles não devem disfarçados, nós temos que saber enfrentá-los,
encará-los com uma mente atenta. É possível fazer isso e manter o foco. Aqui,
na nossa capelinha linda, tá cheio de mosquitinho, tô vendo um ninho aqui, mas
eu tomei banho. Eu estou limpinho. Muitos mosquitinhos estão entrando no meu
ouvido, estão aqui, às vezes, tem que tomar cuidado para não engolir um, ou
entrar no meu nariz. Eu fico, aqui, espantando. É assim a vida. A vida é
impermanente. As coisas acontecem, a gente não planeja. Só que a mente condicionada,
pode começar a ficar muito preocupada com os mosquitinhos e aí ficar irritada,
e se desconcentrar, para vocês talvez, seja até um trabalho mais intenso se
alguém tiver com esses mosquitinhos em volta. Vocês estão ouvindo. Eu estou
trabalhando aqui a minha atenção para falar, isso ajuda um pouco mais, talvez.
Mas isso pode acontecer lá no zazen, pode ser um mosquitinho, ou outra coisa.
E, qualquer elemento externo pode ser um fator que faça com que a nossa mente
condicionada, o nosso eu, pule para fora. Ops. Mosquitinho, mosquitinho,
mosquitinho, mosquitinho, né. É possível manter o foco, seja com uma dor
física, seja com mosquitinho. Mesmo espantando os mosquitinhos. Mesmo os
mosquitinhos entrando no ouvido.
O foco é um exercício de reestruturação, reeducação
de nossa consciência, de nossa percepção. O sentar e meditar ou praticar a
plena atenção à respiração, em todas as ações é a forma de trabalhar a nossa
mente para chegar a esse ponto. Com o tempo, a mente consegue lidar com as
situações com um grau cada vez menor de stress. Como eu falei de manhã, os
problemas irão continuar a acontecer, os mosquitinhos vão continuar. Eles não
entendem simplesmente que eles estão errados. Eles estão funcionando dentro do
instinto deles, são insetos, o que está errado com o mosquitinho? Ele não está
fazendo isso de propósito.
Durante a prática, a melhor forma a trabalhar essas
questões, pensamentos desviantes, desconcentrações, a dificuldade de manter o
foco, é continuar trabalhando a concentração, a atenção à respiração. A
respiração determina grande parte das nossas emoções, nos nossos modos de ação.
Se nós estivermos desbalanceados, a tendência da nossa respiração é ser muito
rápida. Observem se vocês conseguirem, quando estiverem irritados, como a
respiração fica mais intensa. Quando nós estamos excitados a respiração fica
mais intensa. A experiência do zazen é fazer com a mente aprenda a se
concentrar dentro de contextos que são claros e diretos no agora, as coisas
como elas são. Não há subterfúgios, não
há ilusões. Se uma pessoa, por exemplo, gosta muito de futebol, gosta muito, é
fanático por futebol, essa pessoa pode ir a um estádio assistir um time que
gosta, e ficar lá horas atenta à bola no campo, sem qualquer esforço maior,
mesmo que seja de uma forma distorcida, a mente consegue entrar num nível de
concentração. Mas é uma concentração falsa porque ela é baseada na excitação.
Daí que, experiências de foco a partir da excitação e de aspectos passionais,
tende a levar à emoções intensas e, em geral, ao stress.
Eu costumo comentar que até mesmo o sujeito
que está pulando carnaval lá atrás do trio elétrico, embora ele pareça que
esteja lá realmente muito feliz e alegre, ele não está! A mente dele está em
grande foco de insatisfação. O que há ali é um aspecto de experiência,
extremamente excitante e passional, mas não há tranquilidade na mente. Aquela
alegria ali, é aparente.
(continua)