quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Todos chegam com grandes Eus


(continuação)
Pergunta – Essa busca do despertar, de eliminar os ganchos que a gente constrói pela vida, essa busca também é construída pelo próprio eu, “eu” quero. Essa questão me parece meio paradoxal, porque o próprio eu se empenha pelo despertar e nesse processo ele pode entrar numa armadilha, à medida em que se esforça demais.....
Monge Gensho - Essa é uma grande pergunta, porque inicialmente, todas as pessoas vêm à sangha com seus “eus”, e só vêm porque querem obter alguma coisa a mais. Nunca vi ninguém chegar à sangha e ao ser perguntado por que veio, responder – “Eu vim porque quero ajudar todos os seres, eu vim porque esqueci de mim mesmo e quero me esforçar para libertar outras pessoas”. Não é isso, ninguém faz isso, posso lembrar de mim mesmo. Por que você veio à sangha e senta para meditar? Porque você quer algo para você. Calma, serenidade, felicidade, quer se libertar de angústias, talvez, e, se for profundo, do medo da morte. Quer uma libertação. Depois é que começa a ser confrontado com o dharma, e o dharma irá sempre repetir, tudo começa no eu. 
Se nós olharmos para um treinamento budista, ele começa considerando que tem um eu treinando. Ele diz: “você senta, você pratica zazen, você se esforça, você, fique aqui. Olhem os preceitos. Os preceitos básicos - não matar, não roubar, não enganar, não causar sofrimento com sua energia sexual, não usar drogas, não falar das falhas alheias nem apontar e criticar membros da Sangha - são regras para você, para o seu eu, não são regras para quem perdeu o eu. Mas o caminho para chegar lá começa com o treinamento consigo mesmo. 
É claro que se alguém não tem eu, não pode ser ofendido nem perturbado, não ambiciona nada, não tem nenhum problema. Mas não é isso que acontece com um praticante. O praticante vem porque quer obter algo para si mesmo. Muitos querem graduações, querem fazer seu rakusu, querem progredir na sangha, querem ser melhores. As pessoas então começam com ambições, e só muito depois é que outras possibilidades começam a aparecer. Mesmo entre os religiosos isso é freqüente. Eu vi uma vez um texto Tibetano em que havia uma autocrítica porque religiosos, Lamas, queriam tronos para sentar e ficavam discutindo para ver quem ficava no trono mais alto. No zen não há tronos, mas há títulos e mesmo os monges querem títulos. Um homem chegou para Shunryu Suzuki, grande mestre zen que trabalhou na Califórnia, e lhe perguntou: “Quantos homens no mundo, o senhor diria que estão realmente iluminados? ”E ele respondeu: “Não mais que uma dúzia”. Estamos falando de um universo de quatorze mil monges só no zen. Então, a iluminação é rara. Resolver o problema do eu não é nem um pouco fácil.