quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013
Mitos sobre o expressar e sobre os mestres
Pergunta – Me intriga essa questão...O senhor deu o exemplo da internet, dos meios de comunicação, que são um canal para esse tipo de abertura...Sempre pensei que o que fica trancado, proibido, um dia aparece. O melhor exercício seria sofrer as conseqüências do ato de falar. Me parece que essa possibilidade de expressar é positiva...
Monge Genshô – É uma excelente pergunta. Existe uma escola psicológica que diz que se você não se expressar isso fica guardado dentro de você e isso lhe fará mal. Do ponto de vista budista essa escola está errada. Se você tiver raiva, e expressar essa raiva, ele não diminuirá, quando você a expressa e fala sobre ela você a alimenta, coloca energia nela e com isso ela torna-se mais forte.
Podem observar as pessoas que começam a discutir. Um diz uma coisa, o outro diz outra, o primeiro retruca. Não é a lei da ação e reação, que diz que a cada ação corresponde uma reação de igual força e sentido contrário. Isso nos relacionamentos humanos não funciona. Nos relacionamentos a cada ação corresponde uma reação duplicada, triplicada, quadriplicada, etc. todos sabemos que é assim, todos nós já discutimos.
Experimente quando alguém começar a lhe insultar, não dizer nada, ou melhor, experimente dizer, por favor, fale mais, que preciso mesmo escutar isso tudo. Se não for alimentada com oposição, os cartuchos acabam. Todo mundo tem experiência de família e sabe instintivamente que isso é verdade. Difícil é ficar quieto, não responder. Mas a melhor maneira de retirar a força de uma discussão é não se opor.
Eu posso falar enfaticamente, não é verdade que colocar para fora é bom. Em termos de relacionamento humano o melhor seria você ir até o fundo de uma floresta e insultasse as pedras, as árvores e esvaziar-se...Mas em lugar de você esvaziar-se, do ponto de vista budista, seria ainda melhor você sentar e imaginar a situação e a transformar numa situação de amor, afeto, perdão e compaixão. Deveríamos pensar, “isso não é assim, não é proposital, há um motivo para as pessoas agirem dessa forma, essa pessoa fez muitas coisas no passado que a levam a agir dessa forma comigo hoje, mas eu não devo alimentar”.
Os professores do dharma sofrem com isso freqüentemente. É frequente em conversas entre professores descobrirmos que todos temos os mesmos problemas com alunos que o veneram em um momento e no momento seguinte se transformam em seu maior inimigo. Isso acontece porque existe uma idealização do professor como um homem perfeito, um ser maravilhoso em seu manto de monge, cheio de sabedoria. Eles o julgam sem defeitos, choram em sua frente emocionados.
Mas a sua primeira falta real ou imaginária, tomados por sentimentos de desilusão e raiva, muitas vezes tentarão voltar toda a comunidade contra o professor, dizendo que ele não era o ser perfeito que todos imaginavam. O problema está justamente aí, o ser perfeito estava em sua mente.
Diferentes escolas têm diferentes atitudes. Nas escolas tibetanas há um ditado que diz, “More dois vales distantes de seu mestre”. Na escola Zen o professor senta no mesmo nível dos alunos, não senta em um trono. Cada vez que um aluno o procura dizendo sentir raiva e perder a paciência frequentemente, ele responde que também tem os mesmos sentimentos. Os problemas de todas as pessoas também estão presentes na vida do professor, ele também é homem. É um milagre que ele consiga andar mais ou menos reto. É uma coisa maravilhosa que minha esposa consiga sentar ao meu lado para ouvir palestras e praticar zazen. Ninguém no mundo me conhece mais profundamente do que ela. Ela sabe quando fico irritado, quando perco a paciência, sabe de minhas dores, ela está comigo há muitos anos. Ela sabe o quão humano eu sou. O fato de ela vir praticar sabendo de tudo é realmente maravilhoso.