Monge Genshô: O que caracteriza o mundo do samsara é a procura
incessante. Nós queremos achar algo que nos falte. Na verdade, nós todos
estamos aqui porque vivemos no mundo do samsara, senão, não iríamos ouvir uma
palestra. Se tudo estivesse perfeito, completamente perfeito, não tinha porque
ouvir uma palestra. Temos que conscientizar – ah, eu vivo no mundo da
perambulação. Nós perambulamos procurando felicidades, vamos a uma banca de
revista e vemos a revista dos felizes. O que aconteceu? As pessoas vão lá, lêem
esse tipo de revista sobre famosos, que têm dinheiro, vivem em ilhas, têm iates
ou qualquer coisa assim, achando que a felicidade é alcançada através da
prosperidade, que vou alcançar a felicidade através de ter coisas. Mas isto é o
próprio mundo do Samsara. Perambulo atrás de uma coisa a mais. Aquela coisa que
vejo não é suficiente. Então procuro aquela outra coisa.
Qualquer pessoa que está nesse mundo de perambulação olha em volta e se
compara com os que estão em volta. Os que estão na favela olham em volta e vêem
os outros da favela. E ele vai se sentir próspero, vai se sentir melhor se
estiver mais do que o vizinho. Então ele compra uma televisão melhor do que a do
vizinho, assim então ele acha que se destacou do grupo. Só que se ele continua
crescendo e sai da favela, tem outro grupo, outro grupo e outro grupo.
Uma vez tive a oportunidade de passar em Mônaco. Em Mônaco tem um porto
e nesse porto estão estacionados iates. Mas quem tem um iate de 50 metros é um
pobretão, coitado dele. O cara não é ninguém, tem apenas um iate de 50 metros.
Ao lado tem um iate de um sheik de 150 metros, 3 vezes maior, muito mais alto,
com torneiras de ouro. Aí então ele se vê pequeno no mundo da comparação.
Então o que acontece quando vemos essas revistas por onde comecei, é que
as pessoas olham para a revista para se comparar. Elas olham e vêem a
comparação. Olham e imaginam que existe um outro mundo. Um mundo mais abundante
do que o seu mundo próprio. E atrás de coisas materiais as pessoas fazem isso.
Mas as pessoas fazem isso em outras áreas também.
As pessoas dizem - ah se eu tivesse um amor. A pessoa perambula de amor
em amor. Este amor não deu certo, esse não é suficiente, essa pessoa não tem
tudo que eu queria. Tem falhas nessa pessoa. Aí ela vai para outra
pessoa, outra pessoa, outra pessoa. Isto é também um perambular. Perambula
achando que logo a seguir vai achar. É como se andasse sem rumo num mundo de um
lado para o outro, procurando algo que fosse, enfim, o satisfatório. Agora o
que o mundo do Samsara ensina para nós é que não existe na verdade o
satisfatório. Foi isso que Buda ensinou. Essa é a primeira nobre verdade, não
existe o satisfatório. O satisfatório é inalcançável, pois a característica da
vida é Dukkha, é ser insatisfatória.
Dukkha quer dizer insatisfatório, nunca vou me satisfazer. Mas por que
não vou me satisfazer? Vamos analisar a palavra. A palavra em sânscrito provém
desta raiz – “Duk”. Mas o que significa isso? Duk significa eixo. Então tenho
eixo e tenho uma roda. O eixo da roda. Mas, se o meu eixo estiver deslocado e a
roda estiver assim, o que vai acontecer? Como ela funciona? Ela desenha ciclos,
ciclos assim. Isso é oque acontece com o eixo fora do lugar. Quando Buda disse
– a vida é Dukkha, muitos tradutores traduziram como a vida é sofrimento.
Buda nunca pretendeu dizer que a vida é sofrimento. Vocês já viram essa
tradução, a vida é sofrimento? Pois é, Buda não disse isso. Buda disse que a
vida é Dukkha, que a vida é cíclica, insatisfatória. Ela sobe e desce sem
parar. Então ora tenho amor, ora tenho dor de cotovelo ou tristeza. Ora tenho
riqueza, ora pobreza. Ora satisfação, ora insatisfação. Sempre. A vida é
constituída de coisas muito boas, tem prazeres, tem momentos maravilhosos de
felicidades, de euforia. Ela tem isso, quem poderia negar isso? A vida não é só
sofrimento.