quinta-feira, 25 de setembro de 2014

“Shari, você entendeu? Forma é vazio, vazio é forma”


 (continuação)
Saikawa Roshi: -  Neste Sutra Shakyamuni Buda está falando para seu discípulo Shariputra sobre o Bodhisattva da Compaixão, Kanon. Em algumas traduções Kanon aparece como “Kanjizai Bosatsu” ou “Kanzeon Bosatsu”. “Kan” significa observação, “Kanzeon” significa observação dos lamentos do mundo.

Os lamentos do mundo podem ser as orações, os pedidos, as vozes do mundo. Em outra tradução, “Kanjizai, Jizai” é livre, então, Kanjizai Bosatsu é o Bodhisattva que observa a libertação desse mundo.

O Bodhisattva Kanon diz que praticando profundamente, viu o vazio dos cinco agregados, essas cinco condições ou agregados dizem respeito ao corpo e mente. Porque estamos falando sobre corpo e mente? Porque da cabeça aos pés nós criamos sofrimento. Muitos dos Sutras têm Shakyamuni Buda falando sobre corpo e mente. Seiscentos volumes do Praja Paramita também falam sobre corpo e mente. Esses cinco agregados dividem o corpo e a mente em quatro e em cinco maneiras de analisar a mente - sensação, conceituação, discriminação, consciência e formações mentais. Numa outra forma de analisar, não há olhos, ouvidos, nariz, língua, tato e mente, nesse caso o corpo é dividido em cinco partes ou sentidos e a mente, portanto seis sentidos, diferente da primeira interpretação que cita o vazio dos cinco agregados.

O vazio é como se transplantássemos nossos órgãos, qualquer pessoa pode receber um órgão nosso se houver compatibilidade. Na vida diária dizemos meu corpo, meu coração, meu sangue, mas se fizermos um transplante de órgãos, estes deixarão de ser nossos. As expressões meu sangue, meu corpo e minha pele são condicionadas pelo uso, não são expressões verdadeiras. Da cabeça aos pés tudo é sem fronteiras. As pessoas não conseguem entender que tudo que elas chamam de “meu” é recebido dos outros, nada é realmente seu, mas, coisas como “minha preferência”, “gosto disso e não daquilo”, também é condicionada, por exemplo, quando experimentei café pela primeira vez eu estava amando, o gosto era delicioso, então hoje eu adoro café. Mas se eu tivesse experimentado café pela primeira vez em uma situação em que tivesse perdido um amor, com certeza o gosto do café teria sido horrível, teria sido um gosto amargo como a vida.

A preferência é uma coisa muito condicionada. Não fui eu quem decidiu, as situações ao meu redor condicionaram minha impressão. Não somente café ou chá, mas muitos pensamentos, idéias e tendências de pensamentos vêm de fora. Não saíram de mim, eu recebi através da televisão, jornais, experiências e conversas com outras pessoas. Mas o que fazemos é dizer “minha opinião”, “minha idéia”, mas isso não é verdade e muda muito. Se você dá sua opinião ou idéia para os outros hoje, amanhã elas podem mudar. Nossa mente e nosso corpo também são sem fronteiras.
Observando essas coisas Kanzeon Bodhisattva livrou-se de todas as dores e sofrimento. E Buda diz para Shariputra - “Shari, você entendeu? Forma é vazio, vazio é forma”. Assim também todas as coisas o são, concepção, discriminação, conceituação, percepção, todas são vazias.

**Comentário do tradutor, Monge Genshô – O que o Roshi está querendo explicar é que vazio significa que nenhuma destas coisas, concepção, discriminação etc., possui um “eu” inerente, nenhuma coisa é sua ou de alguém, o coração também não tem um “eu”, pode passar de corpo para corpo e funcionar em outros corpos, por isso esse coração é vazio, vazio de que? Vazio de um “eu” inerente.
(continua)