quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Qual a sua face antes dos seus pais terem nascido?


 (continuação)
O Zen é um método de estudar o budismo, que se utiliza da mesma prática que Buda usou, que é a meditação. Mas a meditação e o Dharma não são propriedades do budismo nem do Zen. Eles estão aí no mundo, existem múltiplos métodos para serem praticados, pois as pessoas são diferentes e, assim, precisam de diferentes métodos. Por isso que nós temos que jamais dizer “eu tenho a verdade, ou este é o caminho e os outros estão todos errados”. Até o conceito de certo e errado, como eu explico no livro “O Pico da Montanha é onde estão os meus pés”, é um engano no campo do absoluto, pois também está no campo da dualidade. Eu não posso dizer, senão relativamente, que isso é certo, e aquilo é errado. Nós temos o dharma, a sabedoria. E nós temos ignorância, é claro. Mas nós podemos sair da margem da ignorância e atravessar para a margem da sabedoria. Isso significa prajna paramita (prajna = sabedoria / paramita = a outra margem). Agora se eu pego o barco, ou um veículo dado – que é uma forma de espiritualidade qualquer –, atravesso o rio da ignorância e chego à outra margem, se eu for um bodhisatva (ser iluminado, repleto de compaixão) eu retorno para ajudar os seres que estão na margem da ignorância. Porque eu não posso ir sozinho, e aquele barco eu não posso carregar nas costas. Por isso os bodhisatvas permanecem aqui. (Final da palestra)

Perguntas

Pergunta: Monge, quando se fala naquela diferença entre atman e anatman, me vem à mente aquela pergunta “como era a sua face antes do seu pai nascer?”. Afinal, existe alguma “raiz” para essa natureza búdica?

Monge Genshô – Então, este é um famoso koan que não comporta uma resposta simples. A pessoa não pode “mostrar a sua face antes dos seus pais terem nascido”. Não há uma resposta lógica para isso, e então a pessoa tem que enxergar a resposta além da resposta. Se ele conseguir isso, ele entrará na sala [do mestre que o fez tal pergunta] como se estivesse carregando uma coisa preciosa. – “Mestre, eu achei! É esta minha face antes dos meus pais terem nascido”. Se você conseguir fazer isso, é um grande passo no despertar. E é por isso que esta pergunta existe. Mas enquanto se procura reponde-la com a mente racional e lógica, ainda não se entendeu a pergunta, já que se trata de uma provocação não lógica. É como se me dissessem para mostrar uma árvore sem raiz. Para esta questão, Joshu respondeu: - “O cipreste do jardim”. Mas daí se você vem com a mente lógica, vai logo dizer que os ciprestes têm raiz. – “Que pergunta absurda é esta?”. E o mestre olha para você e o manda embora. Vá sentar para meditar e só volte  para dizer qual é a árvore sem raiz. E por que o cipreste no jardim é árvore sem raiz? Responda... Isso é um koan! Trata-se de um dos instrumentos de prática que se usa no zen, mas é muito difícil... é um tema que gera uma discussão muito profunda, e não se aplica, por exemplo, a uma palestra para um público iniciante na prática. Embora no zen nós termos a tradição de aceitar todas as perguntas que nos são feitas. Nenhuma pergunta pode deixar de ser respondida. Agora, se você não entende a resposta, azar o seu, pratique mais (risos).