segunda-feira, 8 de junho de 2015

SOBRE O EU

Monge Genshô: O que vimos até agora? Que o eu é construído, baseado principalmente em memórias, não sendo estável. Você acredita nele e acha que é importante. Pior que isso, quer continuar existindo para sempre e por isso vem procurar palestras espirituais, porque tem a mesma angústia de Buda (velhice, doença e morte) e quer uma solução para a morte. Por isso os homens inventam religiões. E nas religiões os homens continuam existindo depois de morrer. Quando Bodhidharma pergunta e pede para mostrar a alma e Hui-K'o não sabe mostrar, ele diz “já te despertei”, pois ele mostra uma coisa muito mais profunda do que ter uma partícula permanente que sobrevive à morte. Ele mostra que, na realidade, o eu é uma ilusão e que nós pertencemos a uma algo muito maior e estamos acreditando no eu, e por isso não despertamos, por isso temos medo da morte. 

Se nós compreendermos verdadeiramente o que é o eu, nem nascimento nem morte tem mais sentido. Então, vamos fazer uma analogia: nós vemos o mar, as ondas na superfície do mar. O mar existe sempre, as ondas surgem e desaparecem, certo? O mar é eterno, as ondas não. Se as ondas souberem que elas não são ondas separadas e sim o próprio mar, elas livraram-se do nascimento e morte das ondas. Pois quem acredita no nascimento e morte das ondas deveria chorar na praia a cada onda que morre.

Por que os homens choram quando uma pessoa é velada? Porque acreditamos nos eus. Como acreditamos nos eus, nós choramos. Como essa angústia é muito grande, criamos crenças de sobrevivência pós morte, porque acreditamos numa ilusão chamada eu. Isso é budismo mesmo. Isso é verdadeiramente budismo. Por isso podemos saber porque budismo não fala nem em deuses e nem em almas. Essas também são construções nossas para fazer com que o eu sobreviva.