terça-feira, 26 de agosto de 2014
O relevante para a prática
Pergunta: Eu já li alguma coisa e já ouvi falar, mas é um pouco difícil entrar na minha cabeça. A questão do renascimento... Porque, assim, no renascimento, o que é que passa? Não é a consciência?
Monge Genshô: Só o carma. O que pode passar de uma vida para outra é apenas o carma. Primeiro nós temos que admitir que existe uma certa coesão de uma onda cármica, senão ela não passaria de uma existência para uma outra existência. O que existe em você são seus desejos, impulsos, apegos, suas características de personalidade com as quais você nasceu, isso é o que você herdou, o tipo de mente que você tem. Mas todo o “eu” é novo. A consciência é produto do funcionamento da sua mente agora. Consciência de um eu, então é o carma que produz identidades, não são identidades que carregam carma. Essa é a diferença.
Pergunta: Buda citou que existem espíritos. Eu já vi trechos, se não me engano, que falavam sobre... espíritos famintos.
Monge Genshô: Mas isso, na tradição, na cosmogonia budista são outras dimensões de existência. Não necessariamente seu carma precisa se manifestar num corpo humano, porque você poderia, se manifestar num mundo sem forma, onde não há corporariedade. Existiria, mas isso não é, de modo algum, artigo de fé. Do ponto de vista do Zen, este assunto não interessa.
Eu posso falar aqui que na cosmogonia budista existem os seis mundos, falamos dos mundos dos semideuses, deuses etc e tal. Há escolas em que fala-se em trinta e dois reinos de existência. É, podem existir, como podem não existir. Para aqui e agora, para o nosso problema do agora, não tem a menor relevância. Isso é irrelevante e é não verificável também, de modo que é um assunto de parco interesse. No tempo de Buda, muitas vezes ele se valeu dessas citações, e os sutras muitas vezes citam o seu mundo, o mundo do hinduísmo. Porque Brahma surgiu, ou Yndra , porque os deuses vieram assistir a palestra de Buda, nos sutras, etc e tal. Isso não significa que existam esses deuses, tanto faz. Para a nossa vida agora, tanto faz.
A única coisa que eu posso raciocinar para você é que assim como você está aqui e tem uma personalidade, ela não deve ter surgido do nada. Ela deve vir de um passado. Ela tem que ser consequência de uma causa, porque não existem efeitos sem causa, todos os efeitos têm uma causa. Há alguma causa para vocês estarem aqui, terem a mente que tem, pensarem do jeito que pensam, e essa causa deve ser pregressa. Essa causa é responsabilidade de vocês. A próxima manifestação de vocês deve ser consequência da mente que vocês construírem agora. Não haveria nenhuma lógica se não fosse assim. Por isso os próximos efeitos terão suas causas, e as causas estarão enraizadas aqui e agora. É só isso. Quais são, como são, exatamente como acontecem, isso não é assunto relevante para nossa prática.